Sou uma mulher, casada com um homem, tenho um filho. Família convencional. Filha de pais casados há 45 anos. Minha vida se encaixa nos padrões ditados pela sociedade. Verdade seja dita, essa foi a minha escolha, e não a fiz porque seria bem aceita, fiz por amor a um homem, poderia ter sido por uma mulher e tudo seria diferente. Verdade seja dita. Não é porque essa foi a minha escolha que ela é certa, que não há outras formas de amor tão legítimas quanto essa! As pessoas se metem demais nas escolhas dos outros!
Verdade seja dita
Minha mãe nasceu em uma família machista, eram nove filhos, quatro homens e cinco mulheres. Daquela família onde as meninas brincam de boneca e os meninos de carrinho, os homens são ensinados a serem “macho alfa”. Aliás, ser “maricas” naquela época era um pecado mortal.
Seguindo esse pensamento da tradicional família mineira, os filhos cresceram. Os homens foram devidamente iniciados no puteiro da cidade como manda o figurino. As mulheres não podiam ser mal faladas, mal podiam pegar na mão do namorado. E assim a vida seguiu. As quatro filhas se casaram, tiveram filhos e cá estou eu. Passei boa parte da vida frequentando a casa da minha avó e sendo testemunha de acontecimentos tristes. O mais triste deles foi acompanhar a vida de uma pessoa.
Um homossexual num reduto machista
Meu tio Batista foi criado nessa família, da mesma forma que os outros irmãos. Era uma pessoa amargurada, infeliz. Ele era gay. Mas ele não era infeliz por ser homossexual, a infelicidade era por ele não ter escolhido isso. Teria sido muito mais fácil ser mais um macho e seguir os passos do irmão. Mas ele não pode. Ele passou a vida no armário. Morou a vida toda na casa da minha avó, nunca assumindo quem ele era. Teve câncer que tomou conta de todo o seu corpo, a alma, certamente havia sido tomada antes, pela dor de não poder lutar para ser quem ele era.
Me entristece saber que não o ajudei. Na época eu ainda não tinha maturidade para isso. A gente desconfiava, mas não podia falar. Não tinha como apoiar. Não fiz nada. Mas aprendi. Ele não teve direito à felicidade. Outros terão.
Verdade seja dita! Ninguém é incentivado a ser afeminado, ninguém é incentivado a ser gay. As pessoas são como elas são e elas tê desejos que são dela. Quando vejo um comentário homofóbico meu primeiro pensamento tem sido aquele velho ditado:
“Quem desdenha quer comprar!”
E quando minha mãe descobriu que minha prima, tão linda, tão feminina e tão meiga tinha uma namorada, foi comigo que ela foi conversar, porque eu tinha a “cabeça mais aberta”. Ela queria conversar com a sobrinha e eu disse:
Se quer conversar, converse. Mas só fale com ela quando você estiver preparada para entende-la e aceitar o que ela é e não para tentar fazê-la mudar de ideia.
Desejo que vocês tenham filhos felizes. Desejo que se lembrem que filho não é um espelho dos pais, que eles tem sentimentos e ideias diferentes dos nossos. Desejo que vocês saibam que pais orientam, que guiam, que educam. Desejo que vocês saibam que, como pais, nós não temos domínio sobre os sentimentos dos nossos filhos. Respeite-os e aceite-os como eles são.
Amor não tem erro!
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