Então, racismo existe? Racismo existe no Brasil? Racismo ainda exite no Brasil? Não é paranoia da cabeça das pessoas?
Essas são perguntas retóricas? Não. Muita gente já se fez. Muita gente já me fez.
Racismo existe no Brasil?
Pra responder, eu queria começar fazendo algumas outras perguntas:
- alguém já chamou o seu cabelo de bombril?
- Já perguntou se você podia emprestar seu cabelo pra ariar panela?
- Alguma criança já falou que não ia discutir com você porque não discute com preto?
- Ou já te disse que preto é burro?
- Alguma amiga já falou que era melhor você não ir na casa dela porque a mãe não ia gostar?
- Já sofreu bullying da turma da escola por “ser da favela”?
- Aliás, já te perguntaram aleatoriamente se você mora na favela?
- Algum motorista de táxi já te perguntou quando você entrou: não tá indo pra comunidade não, né?
- Alguém já te confundiu com empregada doméstica? Ou com babá?
- Alguém já perguntou se você era empregada doméstica da sua mãe?
- Com que frequência você entra numa loja e ninguém te atende?
- Ou entra num restaurante e o garçom te ignora?
Porque essas são apenas algumas das situações que eu já vivi ao longo da vida. Isso porque no último recenseamento de raça do Padecendo eu fui considerada branca. Porque eu tenho a pele clara. Imagina quem tem a pele escura. Aliás, imagina não. Vamos contar algumas coisas que eu já ouvi das amigas apenas sobre a experiência na escola. Coisas como ser excluída pela professora, ou ouvir da professora que preto não aprende, ou ficar sozinha no recreio (sim, muitíssimo comum), ser chamada de preta suja, de macaca, agredida fisicamente, ter os cabelos puxados, ser jogada na lata de lixo, ser jogada do alto de uma escada. Isso só casos de amigas. Racismo existe no Brasil?
Então se você me perguntar: Racismo existe no Brasil?
Eu vou te responder: sim. Não só por casos assim, mas por muitos outros motivos. Mas quando uma pessoa branca me faz essa pergunta eu costumo contar essas histórias e as pessoas costumam dizer: não gente, isso não existe, ou não existe mais. E eu respondo: existe sim, se você tivesse nascido negro você saberia que existe e as pessoas fariam questão de te lembrar isso constantemente.
Então pode existir paranoia? É óbvio, porque racismo é um sistema pedagógico às avessas, você passa a vida ouvindo das pessoas que você é inferior, que você é diferente, que você tem que se colocar no seu lugar. Então quando uma pessoa branca (como lugar de fala), diz pra uma pessoa negra (como lugar de fala): não é bem assim, isso não é racismo, a gente é igual, tudo colorido, a gente se pergunta: mas não foi você que me disse que era assim, a vida inteira? Não é você que continua me dizendo isso todo dia? O que mudou agora?
E eu te digo uma coisa, racismo é igual paquera. Desculpem a comparação. Mas com 12 anos, quando os sinais não são explícitos, você às vezes fica meio confusa, será que aquele cara tá me querendo? Com 40 você dificilmente se equivoca. Você pode chamar de paranoia, eu chamo de experiência de vida. É que o processo pedagógico foi bem sucedido.
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