Às vezes a gestação não evolui, acontecem perdas e abortos e é indiscutível que a mulher precisa ser acolhida e bem assistida em um momento de dor, luto e vulnerabilidade, entretanto, um grande grupo de mulheres relata além da dor da perda, a dor do desrespeito, do descaso, da violência.
A assistência à mulher que perdeu: Como é e como deveria ser
Comumente, mulheres que sofrem abortos, espontâneos ou não, sofrem preconceito. Muitas vezes, profissionais de saúde ficam procurando evidências de que o aborto foi provocado. Muitas vezes as mulheres têm o socorro negado, ou são deixadas sozinhas, largadas de lado, sem direito a acompanhante. As mulheres que estão sofrendo perdas, são colocadas lado a lado com mulheres que estão ganhando seus filhos. O descaso e insensibilidade dos profissionais de saúde é grande e a assistência de um sistema robotizado aumenta a dor daquele momento. A assistência inadequada à mulher em abortamento é mais uma faceta da violência obstétrica, uma violência de gênero, institucional e que afeta mulheres em seu ciclo gravídico puerperal.
Desde 2011, o Ministério da Saúde publicou uma Norma Técnica de Atenção Humanizada ao Abortamento e de acordo com essa norma, toda mulher tem direito à uma assistência digna e humanizada:
“Em todo caso de abortamento, a atenção à saúde da mulher deve ser garantida prioritariamente, provendo-se a atuação multiprofissional e, acima de tudo, respeitando a mulher na sua liberdade, dignidade, autonomia e autoridade moral e ética para decidir, afastando-se preconceitos, estereótipos e discriminações de quaisquer natureza, que possam negar e desumanizar esse atendimento.” (BRASIL, 2011, p.22)
Em 2017, as etapas preparatórias para a 14ª Conferência Municipal de Saúde em Belo Horizonte reuniram cerca de 12.000 mil pessoas nas Conferências Distritais, Livres e Hospitalares. Foram realizadas:
- 151 conferências nos Centros de Saúde da cidade,
- nove conferências distritais,
- sete conferências nos hospitais da Rede SUS e
- 11 conferências livres em parceria com os movimentos sociais.
Uma proposta essencial de humanização da rede de atendimento à mulher foi construída a muitas mãos:
- Comissão Perinatal,
- Abenfo,
- trabalhadoras do Sofia Feldman
- rabalhadoras da PBH,
- Ishtar-BH,
- ativistas,
- usuárias do SUS,
- movimentos sociais,
- coletivo feminista Ana Montenegro
- e outras
E na 14ª Conferência foi aprovada a seguinte proposta:
- Abertura da Maternidade Leonina Leonor em Venda Nova. Maternidade que está pronta desde 2008 e na qual foram investidos quase R$ 5 milhões.
- Implementação das práticas baseadas em evidências na atenção:
- à gestação,
- ao parto,
- ao nascimento,
- ao puerpério e
- ao ABORTAMENTO,
De acordo com as Diretrizes Nacionais de Atenção ao Parto – Conitec/Ministério da Saúde e Norma Técnica de Atenção Humanizada ao ABORTAMENTO, assegurando:
- a atuação da enfermagem obstétrica e das doulas na assistência ao parto e nascimento nas maternidades do SUS-BH e da saúde suplementar,
- garantindo o cuidado obstétrico um para um, com vistas à satisfação da usuária,
- bem como a garantia da atenção humanizada para mulheres em situação de abortamento com destaque para o compromisso dos hospitais de ensino com a formação teórica e prática com trabalho em equipe multidisciplinar desde a formação.
Após a proposta aprovada, o executivo deveria formular o Plano Municipal de Saúde, contemplando as propostas prioritárias. Então o Ishtar-BH, sugeriu uma emenda à LDO 2018, solicitando o cumprimento do Plano Municipal de Saúde. Emenda essa que foi aprovada e incorporada à lei. Entretanto, mesmo tendo sido a proposta de humanização aprovada por 89% dos presentes, a segunda mais votada do eixo de urgência e emergência de BH a proposta não foi incorporada ao Plano Municipal de Saúde.
A dor da perda, a dor do desrespeito, do descaso, da violência.
O fato é que, apesar de todo o esforço demandado por inúmeras ativistas em prol de uma melhor assistência na nossa cidade, no final ainda precisamos de boa vontade política do executivo e do sistema de saúde para que as coisas mudem.
Precisamos também começar a denunciar, escrever para as ouvidorias dos hospitais e relatarmos o descaso e a violência sofridos.
Sendo assim, convido todas vocês a lutar por essa causa, pelo atendimento digno e humanizado às mulheres em seu ciclo gravídico puerperal, 98% das causas de mortalidade materna são evitáveis, esse é mais um motivo para cobrar que a assistência seja adequada e humanizada.
Um abraço
Fonte para Diretrizes e Normas: https://www.observatoriovobrasil.com.br/blank-6
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