Essa é história do amor de mãe da Junya Sant’Anna que tem duas filhas lindas.
Elas são gêmeas?
Esta foi apenas uma das besteiras que escutei e ainda escuto, quando querem matar a curiosidade sobre a minha maternidade. Aliás, repensando, não acredito que querem saber das minhas filhas. Muito menos da minha vida. Trata-se de saciar o que é natural em todo ser humano: A CURIOSIDADE.
Um dia, em uma lanchonete com minhas filhas, Bárbara, a mais velha e adotada aos 3 meses de idade e Gabriela, filha biológica, gerada 7 meses depois da chegada da Bárbara em minha vida, fui abordada por uma senhora, também na fila em que me encontrava com elas:
Ela perguntou: “Elas são gêmeas?”
Eu, na hora, não esbocei nenhuma reação, tinha poucos segundos para respondê-la e soltei apenas um: “Não!”
Ela, a dona curiosa, não satisfeita disse: “Nossa! A mais velha é a sua cara!”
Eu a respondi sorrindo: “Então ela é tão maravilhosa quanto eu sou!”
Minha vontade, era de ter respondido que eram gêmeas siamesas, com diferença de 1 ano e 7 meses entre o nascimento de uma e de outra. Mas fui dar atenção às minhas filhas, que nesta data, estavam com 3 anos e 1 ano e poucos meses.
Bárbara
Bárbara sempre foi muito festeira! Uma menina carismática, sabe como abordar as pessoas, não tem vergonha de perguntar e se solta com facilidade em qualquer local. Sempre que ia buscá-la na escola, quando me via no portão, já vinha correndo e gritando mamãeeeeeeeee! Pulava no meu colo e já abraçava e beijava.
Uma senhora loura e de olhos azuis, “dinamarquesa” presenciando a cena, não resistiu e perguntou:
“O pai dela, é escurinho?”
Eu: “Hummmmmm… sabe que eu não sei?”
E já sai, dando continuidade à festa que a Bárbara preparava para mim, todos os dias quando ia pegá-la na escola.
Racismo e adoção
Embora estejamos vivenciando a era da tecnologia mais avançada do planeta, presenciando a evolução dos Ipad’s, tablets, TV’s finíssimas de LED, carros que quase dirigem sozinhos, assistimos ainda, com espanto, a involução do ser humano, quando falamos de cor, escolha sexual (que não sei se é escolha ou natureza), religião, política.
Perguntas desta natureza, trazem consigo, embutidos na aparente inocência, uma maldade sem tamanho. Pessoas são más e capazes de pequenas maldades que me surpreendem.
Evoluindo um pouco mais sobre a questão do racismo e da adoção, este último em especial, por não demonstrar à sociedade, o tão valorizado DNA, estampado no rostinho dos nossos filhos.
Amor de mãe
Eu nunca quis ser mãe. Cresci ouvindo minha mãe dizendo que era para ter meu trabalho, meu dinheiro e minha independência. Fui seguindo à risca os seus conselhos e, quando estava com 35 anos, bateu a tal dona natureza em minha porta, aguçando a minha vontade em ter filhos. De antemão, por ter a menstruação atrasada desde a primeira vez, por conta de ovários policísticos, já tinha sido alertada por vários médicos, de que seria necessário tratamento para engravidar.
Assim começou a minha saga em laboratórios, médicos, exames, cirurgias… Foram cinco anos de frustrações mensais e vendo, algumas vezes, alguns vários reais investidos, se esvaindo em absorventes jogados no lixo. Cada tentativa, uma esperança. Cada gota de sangue escorrido, uma tristeza.
Desisti da gravidez. Não aguentava mais sofrer. Queria ser mãe. Passei a sentir raiva ao ver na rua, mães com quatro, cinco filhos, jogados no passeio, pedindo esmola. Foi um período muito difícil e, felizmente, muito bem superado.
Entrei na fila para adoção. Quando você faz a sua inserção no banco de dados do juizado, é permitido escolher idade, sexo, cor e se possui ou não doenças tratáveis.
Eu só pensava em uma menina.
Foi uma gestação de 3 anos! Preparei quarto, brinquedos, roupinhas, primeiros cuidados, sem saber quando e como chegaria e qual seria a idade da minha pequena. Nesta espera na fila da adoção, eu me separei do marido.
Não desisti do sonho. Alterei os dados junto ao juizado e continuei e a minha espera. Um dia, a coordenadora chefe do juizado me ligou dizendo que tinham achado uma menina, com quase 4 meses de vida, dentro do perfil que eu tinha solicitado, que era de até dois anos e meio de vida. Marcamos de ir conhecê-la no dia seguinte, ao meio dia, horário do meu almoço. Bárbara, estava abrigada a três quarteirões da minha casa. Quando a buscaram, ainda muito pequena, abriu um sorrisão quando me viu.
Acordei Junya e dormi mãe
Não tive dúvidas de que ela era quem eu estava esperando. Eu brinco com as pessoas, dizendo que eu acordei Junya e dormi mãe. No mesmo dia, no final da tarde, ela já estava deitada em seu berço, de banho tomado e pronta para me deixar completamente surtada! Sim…..eu surtei! A primeira noite que tive que acordar para dar mamadeira de madrugada, a minha ficha começou a cair depressa.
“O que eu estou fazendo com esta menina em minha casa? Eu não vou dar conta! Acordar para dar mamadeira? Eu? Com este sono pesadíssimo e necessário?”
Foram quase quatro dias pensando em devolvê-la ao abrigo e continuar a minha vidinha de solteira. No quinto dia de licença maternidade, e por conta de cuidar desta pequena pérola, eu já me vi completamente apaixonada e presa à esta criança, que tanto desejei. Bárbara me fez ficar de quatro e envolta em uma aura de amor que não consigo explicar até hoje! Descobri sentimentos e desejos, até então escondidos e muito bem camuflados em mim.
A aventura da maternidade deu a mim a oportunidade da prática do desapego e da valorização de outros princípios e afetividades. Passei a ver as pessoas, pela alma e pela capacidade de se superarem e pela grandeza de seus gestos. Contei com a ajuda e apoio de pessoas excepcionais. Fiz bons amigos, reais e necessários.
Cores
Você acredita mesmo, que com toda a minha vivência, sofrimento, aprendizado, eu estou preocupada com a cor da minha filha? Que realmente importa para mim, quando fazem perguntas maldosas sobre o possível pai ou sobre a irmandade de minhas filhas maravilhosas? Se uma tem cabelos cacheados ou lisos, se a cor dos olhos são diferentes?
Eu, como mãe, percebi muito rápido que tenho o dever e obrigação de ensinar a separar da vida dela, o que é bom e o que é ruim. Dar a ela segurança para se tornar uma boa aluna, boa filha e ter um futuro brilhante, como qualquer menina da idade dela. Ensiná-la a transitar de cabeça erguida, orgulhosa por ter conseguido se transformar uma pessoa de bem e auto suficiente em suas decisões. Não baixar os olhos ou curvar-se quando se deparar com as maldades e adversidades que enfrentamos todos os dias. A respeitar as pessoas, pelas atitudes e gestos e não pela conta bancária que o outro possui. Eu não seria tão estúpida de não ensinar a ela o valor de se ter dinheiro! Mas que LUTE por ele! Que tenha conforto e alegrias através dele.
Deixo um pequeno texto de Fernando Pessoa, que diz:
“Eu sei que por algum tempo vou me manter oscilante entre a razão e o desejo. Algumas decisões são tomadas com o coração inquieto e o pensamento tomado por muitas coisas que aconteceram e acontecem, tudo misturado. Sei também que o tempo vai ser meu amigo para essas coisas da vida. Com coragem eu sigo, nessa velocidade que não temo, nem mesmo de ousar ser feliz.”
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