25 de maio de 2014
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Parto Adoção

Parto Adoção – Pela padecente Renata Metzker e seu marido Daniel

Arquivo Pessoal - Renata Metzger
Arquivo Pessoal – Renata Metzger

Depoimento de um casal sobre outra via de parto, o Parto Adoção.

Renata

Há 12 anos casei-me, morava na cidade de Campinas-SP, que fica a 1000 km da minha cidade natal, Governador Valadares-MG. Com 1 ano e meio de casados resolvemos largar tudo em Campinas e voltar para Minas Gerais, pois o nosso maior sonho era ter filhos, e gostaríamos que estes tivessem uma qualidade de vida melhor, e na época, vivíamos uma intensa violência no interior de SP.

Desta forma iniciamos a nossa longa trajetória na tentativa de ter filhos. Foram tratamentos hormonais, fertilizações in vitro. Ficamos grávidos, ufa….. Primeiro ultrassom, gravidez de trigemelares. Um misto de emoções, alegria intensa proporcional a preocupação. E entrando no sexto mês, a grande surpresa, entrei em trabalho de parto. Nasceram o Pedro, o Gustavo e a Beatriz, com prematuridade extrema, e não sobreviveram. O mundo veio abaixo, foi uma punhalada pelas costas. Dias escuros, muito escuros…. perguntas sem respostas… vida sem rumo… enterrar 3 filhos não é fácil.

Mas vamos lá, me contaram que a vida continuava…. mas a minha não….. a dor passava, mas a minha não….. E com a ajuda da psiquiatria e da psicologia as coisas foram se acalmando. Mudamos de casa, fizemos viagens e resolvemos enfrentar nova fertilização. Que loucura, o que eu estava fazendo ali? Não estava preparada para viver todas aquelas assombrações de novo. E veio o resultado: negativo. Mais uma vez um misto de emoções, frustração do resultado negativo, e alegria em não ter que vivenciar todo aquele trauma novamente.

Junto com o resultado negativo veio uma certeza, não enfrentaremos novamente uma FIV. Então é assim, a vida não nos presenteou com filhos, mas nos ofereceu um amor e companheirismo muito bacana, vamos aproveitar, passear, viajar, curtir um ao outro.

No início tudo mágico, programar as viagens, viajar, rever as fotos era demais. Mas voltar a realidade era muito duro, pois tudo continuava exatamente no mesmo lugar.

E agora? Sempre pensamos em adoção…. mas quando a sua única alternativa é esta, as análises tem que ser diferentes (na nossa concepção, claro!). Este filho nunca poderá cumprir um buraco dos filhos falecidos, e nem do luto pela infertilidade, este é outro filho. Estamos preparados pra esta espera?

E uma bela noite, surgiu a adoção nas nossas conversas, e fluiu naturalmente,  e estava tão claro pra gente o que realmente queríamos que logo em seguida enfrentamos todo o processo de habilitação e aprovação para a adoção. Pronto, agora estamos na fila!

E mais uma vez a espera é longa. Foram 6 meses para habilitação. E num belo dia, dois anos depois,  25/02/13, o telefone tocou no meio da tarde. Era a assistente social, falando que tinha uma criança no nosso perfil, se gostaríamos de conhecê-la. Mas é claro que sim!!!! Faltaram palavras, perguntas, argumentos…. pernas bambas, coração disparado, eu quero falar com o meu marido!! Pode deixar, eu mesma ligo!! E marcamos para o dia seguinte!

Conhecer a história do Bernardo, ou o Bernardo? Não, vamos conhecer primeiro a história, não queremos antes conhecê-lo para não nos apegarmos. No conselho Tutelar, ficamos sabendo da história, depois vamos ao abrigo, mas não vamos conhecê-lo, só amanhã. E não conseguimos não conhecê-lo.

Foi amor a primeira vista? ACHO que não…… eu estava tão doída, tão calejada com perdas que não me permitia ter um amor a primeira vista, pois ele ainda não era meu….. Acompanhamos todo o processo burocrático, e no dia 28/02/13, nasceu o Bernardo. Quando o peguei no colo para trazê-lo pra casa, despedi de cada uma das cuidadoras e chorei, chorei muito o nascimento dele. Era verdade, nosso filho tinha nascido, era inacreditável!! Nasceu com 5 meses e meio!

Como detalhe, nós não tínhamos uma peça de roupa ou enxoval no dia que nos ligaram, pois eu não me permitia elaborar novamente um enxoval, criar expectativas e ficar tão frustrada. Além do mais o nosso perfil era extenso, menino(a) de 0 a 1 ano! Mas as coisas fluíram, em dois dias o nosso Bernardo chegou sem faltar nada pra ele…. Nossos familiares, amigos e até conhecidos vibraram e o receberam com tanta intensidade, com tanto amor, que nos deixou profundamente sensibilizados.

E agora estamos aqui, com nosso Bê, de 1 ano e 1 mês, atropelando a casa, nossas vidas, e sendo a nossa razão de viver!

Arquivo Pessoal - Renata Metzger
Arquivo Pessoal – Renata Metzger

Daniel

Não sei se seria tolo dizer isso, mas sempre me imaginei, quando adulto, sendo pai. Parece-me que sempre foi meu destino natural. Porém, nem sempre, ou quase nunca, estamos com as rédeas do nosso destino firmes nas nossas mãos… Após quase dois anos de casamento, resolvemos que era hora de ter filhos, e providenciamos tudo que pudesse ser favorável ao crescimento da família, inclusive uma mudança de cidade, buscando um ambiente mais saudável e harmonioso…Tentativas e investigações, durante muito tempo, revelaram-se literalmente infrutíferas. A única coisa que crescia era nossa frustração.

Tentamos de tudo, inclusive a Fertilização in Vitro, quando minha esposa engravidou de trigêmeos. Evidentemente, entrou em trabalho de parto prematuro e a despeito de todas as medidas ao nosso alcance à época (inclusive uma transferência via UTI Aérea para Belo Horizonte), nossos bebês nasceram. Todos, com pouco mais de 400g. Apenas sobreviveram algumas horas. Minha árdua tarefa foi me dirigir ao cartório no dia seguinte para registrar meus filhos e ao mesmo tempo emitir suas certidões de óbito, para que pudessem ser sepultados. Fui pai por breves minutos, ao constatar que nas certidões havia os seguintes dizeres: “foi declarante, o pai”. Ponto, parágrafo.

Desnecessário dizer a dor que sentimos, a frustração e a revolta. Por que nós? Tínhamos tudo tão bem arquitetado, e de repente, uma tragédia interrompe nossos maiores sonhos. Alguns anos depois, e muitas noites sem dormir tentando descobrir o sentido da vida, resolvemos que não seríamos pais, definitivamente. Sempre nos demos muito bem, e sempre nos completamos, então que tal curtir um pouco a vida, viajar, conhecer outras pessoas, outros hobbys, outros lugares. Foi o que fizemos durante algum tempo.

Mas a sensação de ser uma família incompleta nunca nos abandonou. Numa das várias conversas, depois de anos sofrendo por se sentir deslocados em festinhas infantis, e vibrando a cada visita dos nossos queridos sobrinhos, surgiu o tema adoção. Particularmente, sempre achei uma alternativa maravilhosa, a maior demonstração de amor que um ser humano poderia ter. Sei, pela minha formação, que genética não é tudo. Aliás, é a menor parte do nosso ser. Somos reflexo do nosso ambiente, da nossa criação, dos nossos amores e desamores, e isso é inquestionável. Portanto um filho que não seja apenas geneticamente meu, vai ser o meu reflexo, a minha imagem, o meu legado, da mesmíssima forma, e isso é uma responsabilidade enorme e maravilhosa ao mesmo tempo!

Dúvidas, inseguranças, incertezas, vamos descobrir qual é o caminho? Fomos atrás, e percalço após percalço, em Novembro de 2011 finalmente fomos “habilitados” a entrar na fila de adoção. Ok, vamos esperar. Ligávamos todo mês pra saber qual nossa posição na “corrida”. Alguns meses a fila andava mais, outros andava menos, e a ansiedade só crescendo.

Eis que um belo dia (nem sei se era assim bela, pra mim foi um dia maravilhoso…), estou em minha rotina normal, trabalhando no Bloco Cirúrgico, quando meu telefone toca, e pude atender. Era a Assistente Social da Vara da Infância, me explicando que havia uma criança dentro do nosso perfil, Bernardo, se queríamos saber inicialmente da história dele. Não enxerguei mais nada. Minhas pernas tremeram, apenas imaginando a idéia que sim, meu filho estava nascendo! Liguei pra minha esposa e desmarquei todos meus compromissos profissionais da semana.

Chegamos pra conversar com a Assistente Social na Vara da Infância, que nos contou toda a história do Bernardo. Não consegui prestar atenção. Queria demonstrar sobriedade, equilíbrio, mas meu coração batia tanto que eu achei que dava pra ouvir. Queria conhecê-lo. Marcamos de ir ao abrigo, mas com a condição de não o conhecer, apenas saber mais um pouco da história. Afinal, estávamos surrados por tantas perdas na nossa vida, não queríamos ficar expostos mais uma vez.

Obviamente, não resistimos. A Assistente do abrigo nos perguntou se queríamos vê-lo, mesmo sabendo que não havíamos combinado. Mais que imediatamente dissemos que sim. Meu coração saía pela boca… Ela nos trouxe um pequeno bebê de 5 meses de idade, não me recordo qual roupa ele vestia, mas o colocou no colo da minha esposa. Desconcertada, e tão machucada pela vida, ela não sabia o que fazer. Mas lá no fundo já tinha a resposta. Quase não ficou com ele no colo, mais uma vez sucumbindo ao instinto de autopreservação, e logo passou para que ficasse no meu colo. Ele se ajeitou, e calmamente encontrou uma posição aconchegante para passar o resto do tempo da visita no colo do seu pai.

Nos despedimos dele e da equipe do abrigo, sem uma palavra sequer por uns cinco minutos, mas já sabendo no fundo do nosso coração, que nosso bebê havia nascido. Sim, era meu filho, e eu finalmente seria pai. Rodamos quase todas as lojas da cidade em busca de um berço de pronta entrega, missão quase impossível.  Afinal, quem engravida e ganha um bebê em três dias? Resposta: nós. Chegamos na Av. Silviano Brandão, polo moveleiro de BH e em UMA loja havia um berço para pronta entrega. Pesadíssimo, todo desmontado, sem manual de instruções (apenas uma folhinha muito da sem-vergonha que pouco ajudou). Oras bolas, se eu dou conta de montar peças do meu jipe, montar o berço é o mínimo que posso fazer! Comecei às 17h e terminei lá pelas 2h da manhã. Missão dada é missão cumprida!

No dia seguinte fomos às mais diversas lojas de roupas, carrinho, bebê conforto, cadeirinha. Acabávamos de fazer uma compra, chegávamos em casa, e constatávamos que faltava mais um monte de coisas. Chegamos a voltar duas vezes na mesma loja, no mesmo dia, para alegria da vendedora e da operadora de Cartão de Crédito….

Mas era questão de honra. Teríamos nosso lar pronto pra receber nosso filho!

Corremos contra o tempo, pulamos refeições, emagrecemos três quilos cada um, mas ao final de três dias (nos quais em TODOS fomos vê-lo e acompanhá-lo em consultas) tínhamos uma casa pronta pra receber nosso bebê. Nem dormíamos à noite, pensando em como ele estaria longe da nossa companhia. Nasciam neste momento, os pais do Bernardo. Nossa família estava finalmente completa.

Desde então, ele é nosso raio de luz, nossa pilha, nossa razão de existir, de lutar, de respirar. Nossa vida sem ele não é uma opção, nunca mais… E somos cada dia mais felizes e realizados, com nosso pequeno milagre do destino!

 

Leia a continuação dessa história:

Parto Adoção – Parte 2

 

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